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Robert Clark

DIANA COSTA – O OUTRO LADO DAS COISAS
“A pintura … é um espectáculo de alguma coisa unicamente por ser um “espectáculo de nada”,
por romper a “pele das coisas” para revelar como as coisas se tornam coisas, como o mundo se
torna mundo.” Maurice Merleau-Ponty
A pintura é uma arte metamórfica. Cada marca, cada gesto, cada movimento do pulso pode
transformar tudo numa outra coisa. A tinta é fluida. A sua natureza é escorrer e fundir-se. O
seu maior potencial é comover-nos. A tendência de uma cor é hibridar-se com outras cores a
fim de criar subtilezas inauditas. A convergência dos gestos enérgicos do pintor com a matériaprima
da tinta traça paralelos entre os impulsos criativos da natureza humana e as forças
ritmicamente motrizes da própria Natureza.
A tinta é táctil e adesiva. O seu brilho, granulação e textura podem estabelecer um contacto
com os nossos impulsos mais íntimos. A sua fluidez cativa e seduz e, por vezes, repugna. O seu
corpo e carnalidade reflectem e magnetizam o corpo e a carne dos nossos desejos e intuições.
A capacidade da tinta para evocar imagens e atmosferas, o seu carácter sugestivo, eliminam a
divisão entre o abstracto e o figurativo. Uma imagem pintada não é abstracta nem figurativa. É
ela própria: um catalisador ambíguo dos sonhos. Ou é simultaneamente abstracta e figurativa.
Corporiza a mais elementar provocação ao futuro florescimento da existência: tudo encerra
mais do que parece à primeira vista.
O recente trabalho da pintora Diana Costa traz-nos estes pensamentos à ideia. Estamos, o que
é invulgar, perante uma jovem artista que parece acreditar no potencial poético da arte e da
vida. Ela pinta quadros tão íntimos como cartas de amor ou lamentações de perda. A sua
ambição parece ser a criação de um lirismo visual: a evocação de imagens que poderão ser
emocionalmente tão fascinantes e inesquecíveis como a mais especial letra de uma canção.
Nos seus devaneios pintados, um modo de expressão ou uma mudança de forma evocam as
imprevisibilidades complexas e empolgantes das emoções que, apesar do saber teórico do
mundo da arte contemporânea e do cinismo da nossa cultura do século XXI, continuam a surgir
como se do nada e a contagiar-nos com um entusiasmo ardente.
Um momento antes, não havia nada. Um momento antes, a única base que progredirmos era
uma superfície em branco e uma incerteza que nos levava a duvidar terrivelmente de nós
próprios. Ora, sendo a pintora poética que é, Diana Costa criou alguma coisa do nada. O que
agora vemos é um exemplo de como podemos abrir os sentidos à rica experiência do mundo.
Como a própria artista, com uma consciência tipicamente auto-reflexiva, afirma: “A arte é um
enigma. A verdade do que ela é é por ela revelada e por ela escondida. Através da obra de
arte, podemos compreender-nos do outro lado das coisas”.

Robert Clark

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